
Pedra de Lume
Ilha do Sal, Cabo Verde

Introdução
Pedra de Lume - de Alume ou Alúmen (do grego Als, Alos) – Sal.
A ilha do Sal do arquipélago de Cabo Verde é um destino turístico procurado por pessoas de todo o mundo. Após alguma relutância da esposa com a fobia de voar, lá fomos mais dois casais amigos passar alguns dias à ilha com o nome de Sal e cujas salinas em "Pedra di´Lume" situam-se dentro da cratera de um vulcão extinto num cenário geológico espetacular.
Localização


O arquipélago de Cabo Verde situa-se no Oceano Atlântico entre 600 a 800 Km da costa mais ocidental de África. É constituído por 10 ilhas divididas por dois grupos. Ao norte as ilhas do barlavento são: Santo Antão, São Vicente, Santa Luzia, São Nicolau, Sal e Boa Vista. A sul as ilhas do sotavento são: Maio, Santiago, Fogo e Brava.
A ilha do Sal é uma das ilhas do Barlavento com 216Km2 de superfície e extensão máxima de 30Km no seu comprimento e 12Km na largura. É uma ilha plana, exceto no norte com alguns cones vulcânicos, desértica com algumas acácias dispersas num solo árido e vulcânico. A capital é Espargos localizada perto do Aeroporto Amílcar Cabral no centro da ilha e Santa Maria com as suas praias é o centro turístico a sul.

As salinas de Pedra de Lume situam-se a 4Km a leste de Espargos e fazem parte do roteiro turístico da Ilha.
Geologia


O Arquipélago de Cabo Verde pertence juntamente com os Açores, a Madeira, as Selvagens e as Canárias a um conjunto de arquipélagos existentes no Atlântico Norte e Central designado de Macaronésia. O arquipélago é constituído por 10 ilhas e pequenos ilhéus e a sua datação está entre os 115 Ma e os 142 Ma. As ilhas mais antigas são as mais orientais ou as que estão mais próximas da placa africana como as ilhas de Maio, Boavista e Sal. Todos os arquipélagos da Macaronésia, incluindo Cabo Verde têm formação vulcânica através de pontos quentes (Hot spots) localizados em profundidade no manto subjacente e que se materializaram à superfície através de ilhas com cones vulcânicos. A ilha do Sal por ser a mais plana do arquipélago foi designada de inicio por Lana ou Lhana e cujo nome foi substituído por Sal quando os primeiros habitantes iniciaram com sucesso a exploração do sal-gema e marinho.


As elevações topográficas mais importantes estão distribuídas principalmente na parte setentrional da ilha e são: Monte grande – 406m, Rocha de Salina – 299m, Cagarral – 173m e Monte Leste – 263m.
Geologicamente a ilha divide-se em três zonas distintas. A norte da povoação de Palmeiras as rochas são constituídas por campos de lava basáltica com lapili e tufos, cobertos em pequenas zonas por calcários terciários.




A sul da povoação de Palmeiras até à praia do Cascalho os mantos basálticos estão cobertos por grandes áreas de calcário terciário mais ou menos em estratos horizontais e por pequenas manchas de sienitos, monzonitos, dioritos, gabros, doleritos etc. A terceira zona que ocupa a parte meridional da ilha é formada por camadas de calcário cobrindo as rochas basálticas e por extensas dunas. Na zona norte, grande parte das lavas expelidas tiveram origem do Monte Grande e da Rocha de Salina. A ilha teve uma época durante alguns milhões de anos em que as formações basálticas abaixo do nível do mar sofreram a acumulação de formações coralinas que deram origem ao calcário. Entretanto a ilha emergiu com estes sedimentos calcários, os quais foram sendo intercalados e por vezes metamorfizados por outras formações mais recentes de origem vulcânica.
Salinas


A importância deste trabalho e em concreto desta ilha do Sal, reside unicamente na exploração das suas salinas naturais em Santa Maria e de Pedra de Lume. O sal das salinas de Santa Maria seria extraído da água do mar que se infiltrava através das areias de costa. Eram abertas valas na areia com 1 a 3m de profundidade, sendo que a água do mar afluía às valas e consequentemente era elevada por bombas de madeira acionadas pela força do vento que a distribuía pelas marinhas onde o sal era cristalizado com o calor e o vento. O que me chamou a atenção foi a salina de Pedra de Lume que está situada no fundo da cratera de um vulcão extinto e que dista 1km do mar. O fundo da cratera situa-se abaixo do nível do mar e está em comunicação subterrânea com o Oceano e assim se foi produzindo e de acordo com as marés a evaporação da água e a precipitação do sal, formando-se uma verdadeira mina de sal-gema, a qual no inicio da laboração foi contabilizado em reserva mais de 50 milhões de toneladas de sal, sendo na altura uma das maiores minas de Sal Gema do mundo.
Esta salina situa-se entre o Morro vermelho da Rocha de Salina e o porto de Pedra de Lume e corresponde a uma caldeira de explosão hidroclástica do tipo maar, subcircular com 1200 metros de diâmetro e bordo de cota variável entre 35 e 124m. No interior da estrutura assinalam-se alguns depósitos sedimentares com afloramentos carbonatados, áreas antigas de terrenos salgados e nas bordas das salinas agregados densos de cristais de gesso.


O acesso às salinas faz-se através de um túnel aberto na lateral da caldeira do vulcão e o transporte do sal até ao porto de Pedra de Lume era feito através de cabos aéreos onde era carregado em batelões que seguiam para águas profundas ao largo da ilha a fim de descarregar para navios de grande porte.


História
A ilha do Sal foi descoberta em 1460 por António da Nolle que lhe deu o nome de Lhana ou Chã. A aridez da ilha e a falta de recursos hídricos assim como o ambiente desolador da ilha, fez com que esta se mantivesse deserta durante vários séculos. É possível que tivesse alguma ocupação esporádica antes do século XVIII por parte de alguns pescadores ou outros.
"(…) Ao chegar a terra, encontramos algumas cabanas que estavam em bom estado e, pela erva que estava dentro delas, parecia que gente havia ali estado recentemente, talvez para apanhar tartarugas ou homens dum navio encalhado ou lá deixados por piratas." (Capitão George Roberts, Ilha do Sal, 1720).


A existência de salinas naturais iria mudar a condição da ilha. Manuel António Martins, um abastado comerciante residente na ilha da Boa Vista, seria o responsável dessa grande viragem. Após a sua viagem à ilha do Sal em 1796, este proprietário requereu a D. António Coutinho de Lencastre, na época Governador Geral da província de Cabo Verde, a vontade de investir na ilha do Sal. A resposta veio deferida no ano seguinte e Manuel António Martins foi incumbido como Sargento Mor e Administrador dos reais rendimentos da Ilha do Sal. Desta forma estavam lançadas as bases para o inicio do povoamento e exploração efetiva da ilha, em concreto no domínio das salinas. Para além da mão-de-obra local proveniente da Boa Vista, Manuel António Martins foi também buscar escravos à costa africana para trabalharem nas salinas. A primeira povoação da ilha do Sal surgiu à volta do porto de Pedra de Lume, acalentada por uma capela erigida a Nossa Senhora da Piedade. No inicio o sal era transportado até ao porto por caminhos abertos nas cristas dos montes. As dificuldades nesse trajeto levaram que Manuel António Martins tomasse a responsabilidade de abrir um túnel entre as salinas e o porto, perfurando a lateral da caldeira do monte Pedra de Lume, obra de grande vulto no contexto da época e que terminou em 1808 com o custo total de 30.000 cruzados.


A indústria salineira não se limitou só a Pedra de Lume e uma nova salina seria descoberta mais a sul na ilha. Mais tarde em 1834, nascia o principal povoado da ilha em Santa Maria, marcado por casas de madeira importadas da América, onde foram lançados os alicerces para a igreja matriz em 1851. Em Santa Maria, Manuel António Martins construiu as marinas, instalou bombas de vento para as alimentar e mandou assentar linha férrea para levar o sal até ao porto de embarque. Segundo consta esta foi a primeira linha férrea assente em todo o território português, tendo começado a funcionar em 1837.


Os primeiros aglomerados populacionais estiveram diretamente ligados à industria salineira e ao escoamento do sal pelos seus respetivos portos e ancoradouros, a destacar para além de Pedra de Lume, os portos de Santa Maria e da Murdeira. O principal destino do sal até 1887 foi o Brasil, altura em que o agravamento das taxas de importação ao sal por parte do Brasil, quase ditou o fim da indústria salineira na ilha do Sal. Mais tarde no inicio do século XX a industria do sal voltou a erguer-se com o incremento de atividades empresariais e em 1919, os herdeiros de Manuel António Martins começaram por vender as salinas de Pedra de Lume a um comerciante de Santa Maria com interesses no Senegal. Este comerciante acabou depois por constituir a sociedade "Salins du Cap Vert" que veio a abrir novos mercados ao escoamento do sal na costa africana. A salina de Santa Maria levaria uma nova alavancagem com a Companhia de Fomento de Cabo Verde. Por esta altura nas salinas Pedra de Lume seria instalado um teleférico com 1100 metros de comprimento e capacidade para transportar 25 t de sal por hora entre as salinas e o porto de embarque. Em Santa Maria seria construída uma fábrica com máquina movida a vapor que fazia mover um forno rotativo para secar o sal, moinhos, elevadores e ensacadores. Por volta de 1927 a Companhia de Fomento de Cabo Verde associou-se a uma empresa portuguesa de comércio geral sediada no Congo Belga que se encarregou de comercializar o sal nesse país. Para o efeito foi modernizada a linha férrea da salina de Santa Maria e construída uma nova ponte com cais de embarque. Em 1960 o Congo Belga tornou-se independente e com isso nacionalizaram a empresa que comercializava o sal nesse país e em resposta a exploração do sal declinou acentuadamente vindo a salina de Santa Maria a ser extinta mais tarde em 1984. Presentemente as salinas de Pedra de Lume são de um consorcio italiano que as mantém em manutenção para visitas e banhos para turistas.
Mineralogia
A ilha do Sal geologicamente apresenta fatores interessantes a nível mineralógico relacionado com as emissões extrusivas do magma onde é descrito em alguns locais, xenólitos com cristais de olivina, rochas com cristais de augite, piroxenas e anfíbolas. Também é mencionado a localização de amígdalas com carbonato (calcite) e zeólitos. Este aspeto mencionado sobre zeolitização não é de estranhar, principalmente devido à superfície calcária da ilha e ao seu contato com o basalto em que normalmente os fenómenos de zeolitização estão associados, quer nesta ilha como em outras ilhas dos arquipélagos da Macaronésia.


O estudo geológico sobre a caldeira das salinas de Pedra de Lume indica depósitos sedimentares com afloramentos carbonatados, áreas antigas de terrenos salgados e nas bordas das salinas agregados densos de cristais de gesso. As amostras mais representativas das salinas é o sal gema ou Halite - NaCl - Cloreto de Sódio.


As amostras aqui representadas foram adquiridas em Santa Maria como souvenir. A politica de Cabo Verde no controle de espécies geológicas para estudo científico ou outras sem ser os haloides de souvenir é rigorosa. Quem for apanhado na alfândega com amostras diferentes, as mesmas são confiscadas e a multa é de 50,00 euros. (Chamada de atenção do guia turístico quando viu o meu interesse nas pedras).

A amostra de Alunite - KAl3(SO4)2(OH)6 - (Sulfato básico de alumínio e potássio) foi adquirida numa loja e estava juntamente com outras amostras de sal. Percebi rapidamente pela cristalização romboédrica que era diferente. Até ao momento parece-me ser a Alunite, de qualquer modo fiz o teste com HCL para reação ao carbonato e o resultado foi negativo.
Referencias:
Geologia da Ilha do Sal - P. Costa Torres, L. Celestino Silva, A. Serralheiro, M. Hermínia Mendes, J. Macedo Gomes & A. Mota Gomes.
A Geologia do Arquipélago de Cabo Verde - J. Bacelar Bebiano.
Museu do Sal, Santa Maria, Ilha do Sal, Cabo Verde.
Martins da Pedra